por Luiz Carlos
Azenha
O senador Roberto Requião não é fã incondicional do
modelo adotado pelo governo Dilma para o setor elétrico. Diz que os
consumidores do Paraná eram e continuam sendo prejudicados. Mas rejeita a noção
de que a empresa estatal de energia do Estado, a Copel, não tenha aderido à
proposta do governo federal – de
antecipar a renovação de concessões em troca de redução de tarifas — para
defender o patrimônio público. Isso porque, segundo o senador, 70% das ações da
Copel estão nas mãos de acionistas privados, cujo interesse fez o Paraná deixar
de ter a tarifa mais baixa do Brasil.
No ano passado, durante o bombardeio contra a medida
provisória do governo Dilma que alterava o setor, para reduzir o custo das
tarifas, Requião fez um discurso inflamado no Senado (ver abaixo). Em recente
entrevista, o senador acrescentou detalhes:
Viomundo: Senador, como mudou a gestão da
Copel de quando o sr. era o governador do Paraná?
Roberto Requião: A Companhia de Energia Elétrica do
Paraná, quando eu assumi o governo, estava falida. Falida não apenas por má
gestão, mas em função de desvios administrativos. Ela fez um acordo com a
Argentina, de compra de energia, que era mais ou menos assim: vamos supor que ela
comprava o megawatt hora da Argentina por 117 reais, é apenas um exemplo, não
me lembro qual era o valor exato, é aproximado. A Argentina naquela época não
tinha energia para oferecer, estava numa crise, falta de energia muito grande.
A fornecedora comprava energia no mercado spot brasileiro, a 30 reais o
megawatt, e vendia à Copel por 117. A Copel comprava energia brasileira, às
vezes dela mesma — que vendia por 10 reais — e comprava por 117! Eu tive que
agir e liquidar com esse tipo de contrato.
Viomundo: Houve outros casos parecidos?
Roberto Requião: Sim, a Copel tinha feito uma usina a
gás em Araucária e ao lado tinha feito uma usina de processamento de gás,
tocada por americanos, porque diziam que o gás da Bolívia não seria compatível
com a usina de produção de energia. Eu levantei uma suspeita a respeito disso.
Fui ao Texas conversar com especialistas em usinas de gás, com toda a
direitoria da Copel. Eles vieram ao Brasil e a conclusão a que eles chegaram é
que a usina de retificação de gás era absolutamente desnecessária. Tinha
custado uma fortuna para a Copel. O contrato com a empresa americana que tocava
a usina era de longo prazo. Eu tentei rescindir o contrato e eles pediram 5,5
bilhões de indenização. Acabamos indo para um tribunal de Paris, uma disputa
dura. O tribunal acabou demorando muito para decidir e num determinado momento compramos a usina do
grupo americano por 400 milhões de reais. Antes que eu assumisse, todos os
contratos eram feitos em detrimento da própria Copel, para favorecer grupos
privados e muito provavelmente envolvendo comissões.
Viomundo: Isso mudou mais recentemente,
depois da eleição do Beto Richa?
Roberto Requião: Nós conseguimos com muito custo
recuperar a Copel. Daí, esse pessoal ganhou a eleição de novo, o tal pessoal comandado
pelo Cassio Taniguchi, que foi secretário do Planejamento do [ex-governador]
Jaime Lerner e hoje é o secretário de Planejamento do Carlos Alberto Richa. A
primeira coisa que eles fizeram foi subir a participaçao do lucro do setor
privado de 25% para 50%. Estão novamente colocando a empresa em dificuldade.
Subiram a tarifa de uma forma fantástica. O estado do Paraná, no meu governo,
teve a menor tarifa do Brasil. Não tem mais, é altíssima. Fizeram isso para
alavancar a participaçao dos lucros dos acionistas. A impressão que a gente tem
é que eles vão tentar inviabilizar a empresa para justificar a venda da Copel.
Viomundo: A Copel alega que não participou
do plano da presidente Dilma para proteger o seu patrimônio, a capacidade de
investimento e os interesses dos paraenenses. É verdade?
Roberto Requião: Não, absolutamente. Não quiseram
participar em função da lucratividade dos sócios privados. Essas usinas, todas,
já estão amortizadas. Estavam querendo continuar a cobrar dos consumidores a
amortização. O que a presidenta fez foi eliminar a amortização.
A Copel tem usinas antigas, o que eles chamam no jargão
do setor hidrelétrico de energia velha. O preço do megawatt das usinas antigas
da Copel, que já estão amortizadas, fica entre 4 e 5 reais, um pouquinho mais
na transmissão e um pouquinho mais na distribuição.
A energia do Paraná podia ser muito barata, mas tem um
porém e a culpa não é deste governo, é do proprio sistema nacional, que obriga
a nossa companhia a vender a energia para um pool nacional. Vendemos por um
preço baixo e para distribuir a nossa própria energia temos de comprar por um preço alto, que vai para amortizar o
custo fantástico das hidrelétricas instaladas na época do FHC e mesmo
posteriormente.
Então, o Paraná vem sendo sacrificado porque ele tem
usinas públicas, pagas com dinheiro do povo e que são obrigadas a vender para o
pool e comprar do pool energia extremamente cara. Nós já tivemos a tarifa mais
baixa do Brasil, mas ainda a assim a energia custa muito caro. O megawatt custa
264 ou 266 reais, na Argentina custa hoje 88 reais.
Viomundo: Quem são os acionistas da Copel,
hoje?
Roberto Requião: As ações preferenciais da Copel
foram praticamente vendidas na sua totalidade. O estado ficou com 51% das ações
ordinárias, portanto tem o comando da empresa. A Copel só não foi privatizada
na época do Cassio Taniguchi em função dos ataques de 11 de setembro nos
Estados Unidos. Por causa do ataque não teve o leilão. Depois eu assumi o
governo e não deixei acontecer, mas ela estava para ser colocada em leilão na
bolsa de Nova York.
Viomundo: Ainda pode acontecer…
Roberto Requião: Eu espero que não. Há uma
consciência muito grande da sociedade sobre a importância das empresas públicas
para a oferta de energia barata. Mas enfatizo o esforço do governo do Paraná e
do povo do Paraná para amortizar o preço dos exageros das termelétricas e das
usinas privadas no Brasil. A presidenta separou a geração da transmissão e da
distribuicão, porque havia um jogo de faturamento entre as empresas privadas.
Mas a Copel não precisava disso, ela podia ser unitária, tem usinas próprias,
transmissão e distribuição também. O povo do Paraná sofreu com este modelo.
Viomundo: E agora, embora fale em nome do
povo do Paraná, a Copel visa lucro privado?
Roberto Requião: Cerca de 70% das ações, quase 100%
das preferenciais e 49% das ordinárias, estão na mão de acionistas privados. A
Copel está entregue, nas mãos do setor privado. Eles anunciam como grande
vitória a valorização das ações da Copel e essa valorização se apoia no aumento
do preço da energia, ou seja, é feita à custa do consumidor. Isso prejudica o
consumidor residencial e prejudica fundamentalmente o crescimento industrial do
Paraná e do Brasil, de uma forma geral.
Viomundo: Concorda com o modelo adotado pelo
governo Dilma para o setor elétrico?
Senador Requião: O que nossa presidenta deveria ter
feito nesse momento era deixar essas concessões terminarem, criando uma empresa
pública — muito enxuta, cinco ou pessoas –, criando uma empresa pública
proprietária dessas usinas que foram concessionadas e voltariam à União. No
momento, como não teríamos tempo de organizar equipes de operadores, poderíamos
contratar empresas operadoras da energia. Então, imediatamente, não teríamos
mais de discutir essa história de lucro do setor.
Aquela história de que a presidente descapitalizou o
setor hidrelétrico e que eles perderam 55 bilhões de reais … eles não perderam
nada, estão contabilizando o que não tinham. São concessões que estão vencendo.
São pessoas que pregavam a transferência de recursos públicos para grupos do
setor privado lucrarem. O que havia era uma apropriação do setor privado contra
o patrimônio público. O ideal agora seria retomar os investimentos em usinas
hidrelétricas e investir na energia alternativa, notadamente na energia eólica.
Temos muitas usinas eólicas já instaladas no Brasil, mas que não tem linhas de
transmissão para entrar no sistema.
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