Empregado do Consórcio Construtor Belo Monte é flagrado
infiltrado em reunião do Movimento Xingu Vivo com caneta espiã. Em vídeo, ele
diz que trabalhava com ajuda da Abin e que se infiltrou também no movimento
sindical para desmobilizar greves
O Ministério Público Federal recebeu denúncia de que o
Consórcio Construtor de Belo Monte (CCBM) organizou esquema de espionagem
contra movimentos sociais e sindicais que se opõem à construção da Hidrelétrica
de Belo Monte. De acordo com o Movimento Xingu Vivo para Sempre, um empregado
do consórcio foi flagrado infiltrado na
reunião de planejamento realizada neste domingo, 24, gravando o encontro com
uma caneta espiã. Questionado, ele se disse arrependido e concordou em gravar o
depoimento em vídeo abaixo detalhando sua atuação. Além disso, apresentou
crachá e carteira profissional na qual consta o registro da empresa, que foram
fotografados pelos integrantes do grupo.
A procuradora Thais Santi Cardoso da Silva, acionada
pelo advogado do Xingu Vivo, Marco Apolo Santana Leão, diz que ainda não foi
decidido o encaminhamento que será dado ao caso, mas manifesta preocupação
sobre a gravidade do que foi relatado. “Os movimentos sociais têm todo direito
de reivindicar [a interrupção da obra] e essa atitude é extremamente
preocupante”, afirma. O empregado do CCBM chegou a concordar na noite de
domingo, 24, em prestar depoimento ao MPF, mas depois voltou atrás e passou a
negar tudo que havia dito.
Procurada, a assessoria de imprensa do consórcio não se
posicionou antes da publicação desta reportagem. Além do CCBM, o homem flagrado
denunciou o envolvimento da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), que
também não se posicionou até a conclusão deste texto.
Movimento sindical
Em sua denúncia, o empregado do consórcio diz ter
começado a atuar como agente infiltrado no segundo semestre do ano passado em
canteiros de obra para identificar lideranças operários, de modo a desmobilizar
novas greves. Antes disso, em março de 2012, após a morte de um trabalhador,
uma greve geral paralisou os canteiros.
O agente acredita que o trabalho que realizou desde
então foi decisivo para a prisão dos cinco acusados de terem comandado a última
revolta de trabalhadores nos canteiros de Belo Monte, ocorrida em novembro do
ano passado, e na demissão de cerca de 80 trabalhadores.
Ele se infiltrou no Movimento Xingu Vivo em dezembro,
beneficiado pela amizade de sua família
com a coordenadora do movimento, Antonia Melo. Passou então a acompanhar
reuniões e monitorar os participantes.
Flagrado na última reunião do grupo, ele afirmou estar
arrependido, pediu desculpas a todos e prometeu ir a público denunciar a
situação. Após gravarem o vídeo com o relato, representantes do movimento
chegaram a acompanhá-lo a sua casa, onde ele apresentou registro profissional
comprovando ser empregado do consórcio. Ele concordou em prestar depoimento no
Ministério Público Federal no mesmo dia, porém, mais tarde mudou de ideia e
passou a negar tudo que havia dito.
Segundo o movimento, em seguida, ele enviou a seguinte
ameaça em uma mensagem por celular para um dos integrantes: “vocês me
ameaçaram, fizeram eu entrar no carro, invadiram minha casa sem ordem judicial.
Isso é que é crime. Vou processar todos do Xingu Vivo. Minha filha menor e
minha mulher são minhas testemunhas. Sofri danos morais e violência física. E
vocês vão se arrepender do que fizeram comigo”.
Responsabilidades
Antes de se arrepender de ter feito a denúncia, o
trabalhador chegou a dar detalhes sobre o esquema de espionagem, informando
inclusive o nome dos que o contrataram e detalhes sobre como o serviço era
executado. Em nota, o grupo afirma que “apesar da atitude criminosa” e de “não
eximi-lo de sua responsabilidade”, “o Movimento Xingu Vivo para Sempre entende
que o maior criminoso neste caso é o Consórcio Construtor Belo Monte, que usou
de seu poder coercitivo e financeiro para transformar um de seus funcionários
em alcaguete”. O grupo cobra a
responsabilização da empresa e do governo federal devido à participação da Abin
e diz que considera “inadmissível que estas práticas ocorram em um estado
democrático de direito”.
Antes mesmo de o caso ser divulgado, em audiência
pública realizada nesta manhã, deputados federais da Comissão Parlamentar de
Inquérito do Tráfico de Pessoas já haviam manifestado preocupação em relação à
perseguição de movimentos sociais na região. A sessão realizada em Altamira
(PA) tinha como objetivo discutir e levantar
informações sobre o caso de escravidão sexual de 14 pessoas denunciado na
semana passada, que acontecia em uma boate vizinha a um dos principais
canteiros de obras, em área declarada de interesse público para Belo Monte.
Estiveram presentes os deputados federais Arnaldo Jordy (PPS), presidente da
CPI, Cláudio Puty (PT) e José Augusto Maia (PTB).
Entre as principais reclamações e críticas dos
movimentos que se opõem a hidrelétrica estão os impactos socioambientais
previstos, o desmatamento e problemas técnicos no planejamento e execução do projeto.
Os opositores defendem a interrupção da construção da barragem e têm
seguidamente apresentado denúncias de problemas graves decorrentes da obra.
Nenhum comentário:
Postar um comentário