sábado, 21 de dezembro de 2013

As nuances do licenciamento ambiental

Por Jornal GGN
O licenciamento ambiental passa pela aprovação de três esferas: o Ibama, a Funai e o Ministério Público
O papel do Ibama
O licenciamento ambiental é uma obrigação legal prévia à instalação de qualquer empreendimento ou atividade potencialmente poluidora ou degradadora do meio ambiente e conta com a participação social na tomada de decisão, por meio da realização de Audiências Públicas como parte do processo.
Essa obrigação é compartilhada pelos Órgãos Estaduais de Meio Ambiente e pelo Ibama, como partes integrantes do Sisnama  (Sistema Nacional de Meio Ambiente). O Ibama atua, principalmente, no licenciamento de grandes projetos de infraestrutura que envolvam impactos em mais de um estado e nas atividades do setor de petróleo e gás na plataforma continental.
A Diretoria de Licenciamento Ambiental é o órgão do Ibama responsável pela execução do licenciamento em nível federal. O processo de licenciamento ambiental tem três etapas distintas: Licenciamento Prévio, Licenciamento de Instalação e Licenciamento de Operação.
Licença Prévia (LP) - Deve ser solicitada ao Ibama na fase de planejamento da implantação, alteração ou ampliação do empreendimento. Essa licença não autoriza a instalação do projeto, e sim aprova a viabilidade ambiental do projeto e autoriza sua localização e concepção tecnológica. Além disso, estabelece as condições a serem consideradas no desenvolvimento do projeto executivo.
Licença de Instalação (LI) - Autoriza o início da obra ou instalação do empreendimento. O prazo de validade dessa licença é estabelecido pelo cronograma de instalação do projeto ou atividade, não podendo ser superior a seis anos. Empreendimentos que impliquem desmatamento dependem, também, de "Autorização de Supressão de Vegetação".
Licença de Operação (LO) - Deve ser solicitada antes de o empreendimento entrar em operação, pois é essa licença que autoriza o início do funcionamento da obra/empreendimento. Sua concessão está condicionada à vistoria a fim de verificar se todas as exigências e detalhes técnicos descritos no projeto aprovado foram desenvolvidos e atendidos ao longo de sua instalação e se estão de acordo com o previsto nas LP e LI. O prazo de validade é estabelecido, não podendo ser inferior a  quatro anos e superior a dez anos.
Durante o processo de licenciamento, o Ibama ouve os Órgãos Ambientais (OEMAs) envolvidos no licenciamento e os Órgãos Federais de gestão do Patrimônio Histórico (IPHAN), das Comunidades Indígenas (Funai), de Comunidades Quilombolas (Fundação Palmares), de controle de endemias (Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde), entre outros. Neste contexto, as prefeituras dos municípios afetados e/ou atravessados pelo empreendimento são ouvidas sobre a questão da adequada inserção do empreendimento frente ao Plano Diretor de Uso e Ocupação do Solo do município.
No processo de licenciamento, os estudos ambientais são elaborados pelo empreendedor e entregues ao Ibama para análise e deferimento. Para cada etapa do licenciamento, há estudos específicos a serem elaborados.
Para subsidiar a etapa de LP, sendo o empreendimento de significativo impacto ambiental, o empreendedor encaminha ao Ibama o Estudo de Impacto Ambiental e respectivo Relatório de Impacto Ambiental (EIA/Rima). Para os demais empreendimentos estudos mais simplificados são requeridos.
O EIA é um documento técnico-científico compostos por: diagnóstico ambiental dos meios físico, biótico e socioeconômico; Análise dos impactos ambientais do projeto e de suas alternativas; Definição das medidas mitigadoras dos impactos negativos e elaboração de medidas mitigadoras dos impactos negativos; e Programas de Acompanhamento e Monitoramento. O Rima é o documento público que reflete as informações e conclusões do EIA e é apresentado de forma objetiva e adequada a compreensão de toda a população. Nessa etapa são realizadas Audiências Públicas para que a comunidade interessada e/ou afetada pelo empreendimento seja consultada.
Para subsidiar a etapa de LI, o empreendedor elabora o Plano Básico Ambiental (PBA) que detalha os programas ambientais necessários para a minimização dos impactos negativos e maximização dos impactos positivos, identificados quando da elaboração do EIA.
Para subsidiar a etapa de LO, o empreendedor elabora um conjunto de relatórios descrevendo a implantação dos programas ambientais e medidas mitigadoras previstas nas etapas de LP e LI.
O papel da Funai
O papel da Funai é assegurar a proteção ambiental das terras indígenas, estabelecer diretrizes e analisar os estudos referentes aos impactos sobre povos e terras indígenas, e garantir a participação dos povos indígenas em todas as etapas do licenciamento ambiental.
Toda vez que em empreendimento pode afetar comunidades indígenas ou de quilombolas, a Funai tem o dever de defender os direitos indígenas e precisa ser consultada antes de existir uma proposta de empreendimento que possa afetar alguma comunidade e suas terras. A Diretoria de Promoção ao Desenvolvimento Sustentável tem uma coordenação especial para cuidar do licenciamento ambiental, a Coordenação Geral de Gestão Ambiental.
Após audiências públicas e análise do Estudo de Impacto Ambiental, A Funai emite pareceres técnicos para avaliar se o empreendimento é viável ou não. Caso seja, são indicadas ações que precisam ser feitas para controlar os impactos negativos e otimizar os impactos positivos da obra. A partir daí, é elaborado o Plano Básico Ambiental.
O plano não distribui dinheiro e não é feito para resolver os problemas já existentes das comunidades indígenas. Destina-se a controlar os impactos do empreendimento que foram identificados no Estudo de Impacto Ambiental
O papel do Ministério Público Federal
O Ministério Público, no Brasil, opera tanto a nível federal, quanto estadual. Em questão de meio ambiente, interessa o estudo mais aprofundado do Ministério Público Federal e dos estaduais, os quais têm atribuições em questões ambientais.
Cabe ao MPF atuar nas causas de competência de quaisquer juízes e tribunais, para defesa de direitos e interesses dos índios e das populações indígenas, do meio ambiente, de bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico, integrantes do patrimônio nacional;
A Ação Civil Pública é um instrumento processual, que visa proteger interesses difusos e coletivos e pode ser ajuizada pelo Ministério Público, entre outros entes. Logo, as ACP em questões ambientais possibilitam a participação de ambos os MP. Podendo o Federal e o Estadual atuar em conjunto ou separadamente. Legitimidade, neste caso, de um, não afasta a do outro. A competência é comum quando se trata da proteção ao meio ambiente.

Bacia do Tapajós será o centro dos debates entre usinas e ambientalistas

Por Jornal GGN
Tudo aponta a bacia do Tapajós como o centro da batalha decisiva entre o aproveitamento hidrelétrico e a preservação da Amazônia.  Ali está em jogo um potencial equivalente a mais de duas Itaipus, e uma parte vital do bioma amazônico, segundo a WWF-Brasil.
Das 42 usinas possíveis, com geração de cerca de 30 mil megawatts (MW), oito das maiores estão no planejamento do governo até 2021. O rio Tapajós e seus afluentes conformam uma região pouco ocupada, de um milhão de habitantes em 50 milhões de hectares, ao contrário de onde hoje se constroem hidrelétricas como a de Belo Monte, no rio Xingu.
Por isso,o governo promete construí-las ali como se extrai petróleo em alto mar: sem acesso terrestre, transportando pessoal, equipamentos e materiais por via aérea e reflorestando depois o terreno dos canteiros. Mas tais “usinas plataformas” não demovem o povo indígena Munduruku de brigar contra barragens na Amazônia.
Além disso, há muito ouro e, logo, muitos garimpeiros na bacia do Tapajós, cuja hidrovia, se implantada, seria a melhor rota de escoamento agrícola de Mato Grosso, Estado que mais produz soja no Brasil.
Preservar um grande bloco central e outras áreas da bacia, deixando livre o Jamanxim, um dos grandes afluentes do Tapajós, é condição para conservar ecossistemas e espécies indispensáveis, segundo o WWF-Brasil, que desenvolveu uma metodologia para definir áreas ambientais prioritárias.
Essa ferramenta, ou Sistema de Apoio à Decisão (SAD), aplicada à bacia do Tapajós, pode servir de base para negociações que superem os confrontos e conduzam às melhores decisões sobre as hidrelétricas. É o que explica Pedro Bara Neto, líder de Estratégia de Infraestrutura no programa Amazônia Viva do Fundo Mundial para a Natureza (WWF), nesta entrevista.
Segundo ele, na Amazônia, dado o pouco conhecimento de toda sua biodiversidade, faz-se uma aproximação. No caso do Tapajós, detalhou-se uma “arca de Noé”, com 93 ecossistemas terrestres e 28 aquáticos, 46 espécies de aves, 17 de mamíferos e 37 de peixes, além de 20 habitats aquáticos. Também se analisou o uso do solo, o avanço da agropecuária, do garimpo, concluindo-se que 22% do território já está degradado. Mas as áreas protegidas cobrem também 22% e terras Indígenas 20%.
O que se pretende é conservar no mínimo esse grande bloco central (área em volta da confluência dos rios Juruena e Teles Pires formando o Tapajós, onde se preveem pelo menos quatro hidrelétricas). Para ele, algumas usinas são inaceitáveis, como Chacorão (no alto Tapajós, capacidade de 3.336 MW), por estar em terras Munduruku.

O desafio das hidrelétricas da Região Norte

Jornal GGN - 
Para crescer, o país precisa de energia. Este é um fato de difícil contestação e as exigências de respeito à natureza vieram para ficar. Há ainda muita incompreensão sobre a influência das hidrelétricas no meio ambiente, especialmente em regiões pouco desenvolvidas, como no norte brasileiro.
A opinião é de Altino Ventura Filho, secretário de Planejamento e Desenvolvimento do Ministério das Minas e Energia (MME) e um dos mais experientes técnicos do setor, durante o seminário "As hidrelétricas da Amazônia e o meio ambiente", promovido pelo Jornal GGN (www.jornalggn.com.br), em dezembro de 2013.
Trinta e cinco por cento do potencial hidrelétrico brasileiro está na região norte, localizado nos rios à margem direita do rio Amazonas, começando pela fronteira, com o Tocantins-Araguaia. No Xingu, encontra-se a usina de Belo Monte; no Madeira, as usinas de Jirau e Santo Antonio; e no Tapajós, a maior aposta.
Só agora se inicia o aproveitamento do potencial hidrelétrico do norte. Por ora, foram explorados apenas 5%, ante o aproveitamento quase total do potencial das demais regiões brasileiras. Sem uma exploração adequada e racional do potencial do norte, não haverá espaço para a expansão hidrelétrica brasileira.
Pelo modelo tradicional, para compensar o fim das obras e a desmobilização dos trabalhadores, as usinas foram concebidas como projetos de desenvolvimento, ajudando na urbanização, na criação de condições econômicas para os municípios no entorno, como foi o caso de Urubupungá, Ilha Solteira e Jupiá. Os lagos formaram praias, forneceram água limpa, permitiram lazer, navegação, pesca, abastecimento, permitindo novas atividades econômicas, como a agricultura, pecuária e serviços.
No Tapajós, será a primeira vez que se construirá uma hidrelétrica em região não habitada. Com isso, será abandonado completamente o modelo de desenvolvimento até agora padrão, reduzindo as externalidades positivas do empreendimento, mas também os fatores de atrito com as entidades ambientais.
O modelo será da usina-plataforma - nome conferido por conta da semelhança com as plataformas de petróleo.
Será um empreendimento localizado em ponto bem específico e sem implicações ambientais. Não será indutora de desenvolvimento regional. Na fase de construção, serão levantadas instalações temporárias, ao contrário do modelo de vilas operárias, depois transformadas em cidades.
As instalações ficarão restritas ao entorno das usinas, possivelmente na área do futuro reservatório. Não serão abertas rodovias de acesso, com seu potencial de devastação. A construção das linhas de transmissão usará o rio para o transporte.
Terminada a construção, todas as instalações serão desmobilizadas, as condições naturais locais serão recompostas e as áreas adquiridas transformadas em parque nacional.
Na operação, haverá o mínimo de presença humana. Será automatizada o máximo, o transporte possivelmente será por helicópteros.
Maurício Tolmasquim, presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), diz que "esta é uma ideia brasileira". Para ele, o Brasil tem hoje situação energética boa tanto na matriz energética quanto elétrica, e não deve "abrir mão" de seu potencial hidrelétrico. A hidrelétrica tem quatro vantagens: é renovável, tem baixa emissão de gases do efeito estufa, baixo custo e capacidade de utilização de 100% de mão de obra e serviços nacionais"
As três grandes usinas que o Brasil constrói atualmente - Santo Antônio e Jirau, em Rondônia, e Belo Monte, no Pará - são fio d'água. A área alagada, nesses casos, tende a ser menor e a provocar menos impactos socioambientais.
O governo planeja instalar na Amazônia pelo menos 29 novas hidrelétricas. Segundo levantamento de O Globo, ao todo, essas hidrelétricas vão gerar 38.292 MW, quase metade dos 78.909 MW produzidos pelas 201 usinas hidrelétricas em operação hoje no país. Sete delas, como as das bacias do Tapajós e do Jamanxim, serão feitas no coração da Amazônia, em áreas praticamente intocadas de floresta contínua.

Balbina é exemplo do que não deve ser feito na Amazônia

Por Jornal GGN
Até há quatro décadas, Manaus era abastecida por energia termoelétrica, a partir do petróleo. O aumento dos preços desta commodity, a partir de 1973, levou o governo a optar pela construção de uma usina hidrelétrica capaz de suprir Manaus e substituir as termoelétricas, de acordo com o Centro de Estudos e Pesquisa Aplicada (Cepa), da Universidade de São Paulo (USP).
O local escolhido para a nova usina, chamada Balbina, foi o Rio Uatumã, afluente na margem esquerda do rio Amazonas. Desde o início desse projeto, muitos cientistas se posicionaram contra a obra, mostrando erros de planejamento, mas foram ignorados pelo governo. Quando a usina entrou em funcionamento parcial, em 1988, até mesmo o governo reconheceu que ela é uma verdadeira tragédia.           
Balbina é uma tragédia econômica, diz o Cepa, ois o custo da energia que produz é altíssimo. Acontece que o rio Uatumã é pequeno e tem pouca água, e por isso, a quantidade de energia consumiu muito dinheiro. Muito mais do que continuar a usar as termoelétricas.
Balbina também é uma tragédia ecológica, pois destruiu uma área enorme de floresta, destruindo milhões de árvores. Isso porque o rio Uatumã está localizado em região de relevo quase plano, e, por isso, a represa criada pela barragem inundou um espaço exagerado. Não foi só a floresta que se perdeu, mas também muitas espécies animais que habitavam aquele meio ambiente.    
Finalmente, Balbina é uma tragédia social que prejudicou os habitantes da região. Uma parte da sua enorme represa inundou terras de caça e moradia dos índios. Além disso, os peixes desapareceram do rio, no trecho abaixo da barragem, pois a decomposição dos vegetais afogados pela represa tornou a água ácida e poluída. Os habitantes das margens do rio, que usavam os peixes como fonte de alimentação, mudaram-se para outros lugares. O exemplo de Balbina mostra que nem sempre uma usina hidrelétrica é uma boa opção.
Por ocasião da construção da usina de Balbina, a Eletronorte, empresa responsável pelo empreendimento, argumentou que a hidrelétrica seria a salvação para a escassez de energia na região de Manaus e desencadeou uma campanha publicitária contra os críticos da obra: “Quem é contra Balbina é contra você”, dizia o anúncio da estatal, veiculado nas tevês de Manaus.
Contudo, segundo o professor Ruben Caixeta de Queiroz, da Universidade Federal de Minas Gerais, quando a barragem foi fechada, em 1989, todos os alertas dos estudos críticos se confirmaram: em área de relevo pouco acidentado, composta por densa floresta, formou-se um lago de 2.380 quilômetros quadrados para instalar uma potência de energia de apenas 250 MW, com a geração real de apenas 120 MW. Para se ter uma ideia, enquanto a segunda maior usina do mundo, Itaipu, precisou inundar uma área de 0,096 quilômetros quadrados para produzir 1 MW, Balbina, para produzir a mesma coisa, submergiu 9,44 quilômetros quadrados.
Do ponto de vista ambiental o empreendimento produziu um efeito deletério. A quase totalidade da madeira não foi retirada antes de se formar o lago de Balbina, o que provocou a decomposição da matéria orgânica e a liberação de um composto tóxico, o metilmercúrio, que contaminou os peixes. Tudo isso fez com que o grau de mercúrio em Balbina fosse superior ao encontrado nas áreas de garimpo do rio Tapajós. Além disso, o lago de Balbina é responsável pela liberação de dióxido de carbono (CO2) e metano (CH4), gases do efeito estufa.
Muito em função da péssima experiência de Balbina, há muita resistência em relação à Usina de Belo Monte.